O professor de História Alcides Martinelli, 49 anos, 25 desses de magistério, trabalha em duas escolas de Curitiba e ele próprio é um dos pouquíssimos elementos em comum entre elas. Todos os dias, Martinelli divide sua rotina entre as turmas do 6.º ao 9.º ano do Colégio Expoente, nos bairros Água Verde e Boa Vista, e os alunos do Centro Estadual de Educação Básica para Jovens e Adultos (CEEBJA) Maria Deon de Lira, no Boqueirão. Ele se esforça para ensinar o mesmo conteúdo a todos, mas as diferenças nas condições de trabalho são incontáveis. Adaptar-se para conviver entre dois mundos tão distintos – das redes privada e pública de ensino – exige habilidade e motivação. Na instituição particular, que atende famílias de classe média/alta, Martinelli acompanha o mesmo grupo de alunos há quatro anos. Ele conta com satisfação a experiência de ser o principal responsável por tudo o que os jovens sabem sobre História, desde a metade do ensino fundamental até a entrada no ensino médio. "Dá para fazer um trabalho excelente. A qualquer momento, eu posso retomar o que ensinei há uns dois anos e fazer a ligação com um tema atual", diz. A participação dos alunos é intensa. Como a escola é o centro das atenções na vida dos 115 estudantes que têm aulas com o professor, a preocupação maior é aprender, tirar boas notas e sonhar com uma vaga na universidade. | Complicadores - Reproduzir o bom rendimento dessas aulas nas noites em que está no CEEBJA é um desafio diário cheio de complicadores. Em turmas cuja variação de idade vai dos 18 aos 50 anos, é uma raridade encontrar alguém que compareça às aulas movido pela vontade de aprender. Nem mesmo a necessidade de obter um certificado de conclusão – a principal justificativa de matrículas no sistema – evita um grande número de faltas capaz de prejudicar qualquer plano de aulas. As desistências, também comuns, são um motivo a mais para desanimar. Envolvimento dos alunos é determinante - Situação semelhante à de Alcides Martinelli é enfrentada pelo professor de Matemática Sergio Luiz Alves da Silva, de 58 anos. Docente aposentado pela rede privada de ensino, ele prestou concurso público em 2007 e desde então dá aulas no Colégio Estadual Getúlio Vargas, no bairro Cachoeira, em Curitiba. Segundo Silva, ao contrário do que o senso comum pode supor, não é a diferença de estrutura que mais dificulta o trabalho. "Materialmente, eles [estudantes] têm tudo o que é necessário, como computadores e uma tevê em cada sala. O difícil é motivar os alunos", diz. Para o professor, problemas familiares e a criminalidade local deixam os estudantes sem perspectiva. "Não | há participação dos pais em nada. Tenho alunos que vão para a escola apenas para se alimentar", conta. Comparação - Para a comparação, Silva usa como referência seus outros ambientes de trabalho. Duas faculdades particulares, além de aulas extras no Colégio Estadual do Paraná (CEP). Nas turmas de ensino superior, ele lida com homens e mulheres interessados principalmente em progredir na carreira profissional. Mas é a experiência no CEP que lhe mostrou ser possível obter na rede pública um desempenho em sala de aula equivalente ao que se tem em escolas particulares. O fato de o colégio fazer uma triagem para aceitar matrículas, por meio da análise do currículo, é, segundo o professor, o principal motivo para a formação de turmas dedicadas. "Eles [alunos] te dão uma atenção impressionante. Dá pra ver a vontade de aprender e a gente sente o nosso trabalho ser reconhecido", afirma. Mesmo ganhando menos como professor de educação básica do que como docente na faculdade, essa satisfação é citada como a razão mais forte para Silva manter sua rotina. "Não se ganha muito dinheiro no Estado. É a consciência de que o nosso trabalho é relevante que estimula a gente a continuar ensinando", conclui. |
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