Entre todas as disciplinas do currículo básico das escolas de ensino fundamental, geralmente, a Matemática costuma ser a que mais gera dificuldades para os alunos. Prova disso, são os resultados obtidos nas avaliações dos estudantes, que revelam um desempenho mais baixo na disciplina do que em outras matérias, como Língua Portuguesa, por exemplo. Na última Prova Brasil, o avanço no desempenho dos alunos em Matemática foi praticamente nulo ou pouco significativo em relação ao exame anterior. Entre 2007 e 2009, os estudantes do 9º ano do ensino fundamental aumentaram a média em apenas um ponto, de 241 para 242. No 3º ano do ensino médio, a média passou de 264 para 266. A exceção foi o 5º ano do fundamental, onde o avanço foi mais significativo, passando de 189 para 199. A prova faz parte do Sistema de Avaliação da Educação Básica (Saeb) e é aplicada a cada dois anos, com o objetivo de realizar um diagnóstico do sistema educacional brasileiro e de alguns fatores que possam interferir no desempenho do aluno. No Programa Internacional de Avaliação de Alunos (Pisa), um levantamento produzido a cada três anos e que faz um raio-x da situação da educação no mundo, entre 65 países analisados, em Matemática, o Brasil ficou 214 pontos abaixo do primeiro colocado, China (Xangai), e apenas 55 a frente do último, o Quirguistão. Apesar de ser o país que obteve o maior crescimento nas médias, o desempenho brasileiro ainda deixou a desejar, já que menos da metade dos jovens com 15 anos completos não consegue passar do nível mais básico de compreensão. A média internacional estabelecida para a disciplina era de 496 pontos, e o Brasil obteve apenas 386, ficando acima de apenas oito países no ranking. Segundo Willian Schmidt, do Instituto de Pesquisa Matemática e Educação Científica da Michigan State University, nenhum país tem desempenho exemplar em todas as áreas da educação. O problema, na opinião do especialista, é que além de ser uma disciplina difícil por si só, a Matemática ainda é ensinada de forma pobre, o que resulta na grande dificuldade encontrada pelos estudantes. De acordo com ele, os países com melhores desempenhos nas avaliações internacionais possuem características em comum que os diferenciam daqueles com baixos resultados: a coerência, o foco e o rigor. "Cada série precisa focar questões específicas. Não dá para ensinar muita coisa, pois quanto mais ampliado for o currículo, mais raso será o aprendizado. Precisamos ensinar de forma mais profunda, dando mais tempo para aprender no nível correto, sem a necessidade de ficar repetindo", falou durante o seminário internacional "O ensino da Matemática nas séries iniciais", promovido pelo Instituto Alfa e Beto, no Rio de Janeiro, no dia 18 de agosto. Dentre os três fatores, Willian Schmidt, que também é membro da Associação Americana de Pesquisa em Educação e diretor do projeto de Promoção de | Resultados Rigorosos na Educação em Matemática e em Ciências, destacou a coerência. Para o pesquisador, é preciso pensar como, o que e em qual sequência o conteúdo da Matemática será ensinado. Sem isso, de acordo com ele, o estudo torna-se um simples exercício de decorar. "As coisas não podem ser arbitrárias. Nos Estados Unidos, frequentemente, é assim. A instrução não deve ser conduzida desta forma, mas sim com padrões de coerência estabelecidos. Quando não se considera sua natureza cumulativa, a Matemática torna-se uma memorização de factoides não conectados, o que é prejudicial para as crianças, que não conseguem ver sentido na matéria e, consequentemente, não aprendem", comentou, ressaltando que há uma progressão lógica inerente a disciplina e só é possível avançar na medida em que o aprendizado é desenvolvido de maneira correta. O especialista também aproveitou a oportunidade para chamar atenção para outro fator decisivo, a educação de qualidade para todos. Segundo Willian Schmidt, existe forte relação entre pais com educação superior completa e crianças com bom desempenho escolar. Contudo, para ele, um país que deseja se desenvolver de fato não pode educar apenas a elite social. "Nos locais com pessoas mais ricas, vemos que mais crianças aprendem Matemática. Nos países com alto desempenho, isso não ocorre, pois existem políticas públicas para que todos tenham um ensino igualitário. Até nesses locais, existem dificuldades, é natural na aprendizagem. Mas não podemos diferenciar definindo o que cada classe aprenderá", afirmou o educador, lembrando da importância de formar bons professores e valorizá-los. Exemplo de outros países podem servir para o Brasil - Estudos comparativos entre professores da China e dos Estados Unidos revelaram que os docentes chineses, mesmo sem ensino superior, conseguem resultados mais significativos com seus alunos. Em um primeiro momento, isso pode soar estranho, mas existe uma razão: eles conhecem melhor o conteúdo daquilo que ensinam. Para João Batista Oliveira, presidente do Instituto Alfa e Beto, este pode ser um caminho para o Brasil, pois é o conhecimento dos fundamentos, e não a titulação formal, que explica o desempenho superior dos professores de séries iniciais nos países asiáticos. "De acordo com as evidências, um bom professor de séries iniciais não precisa nem ter faculdade. Basta saber muito bem o assunto, isso explica 90% do resultado. É muito mais fácil do que ficar pensando em pós-graduação. Por isso que eu digo, existem saídas. A questão é se o país consegue arregimentar vontade política para que isso seja feito", disse, afirmando, logo em seguida, que não crê que isso vá acontecer. "O governo não cria políticas públicas em favor da população, mas sim pensando nas corporações. Assim, o país não avança. Até porque, infelizmente, não é apenas na educação que é assim", completou. De acordo com o especialista, os | cursos de formação docente não estão nem um pouco sintonizados com as novas descobertas científicas na área e métodos de ensino e aprendizagem. Para ele, aqueles voltados para professores de séries iniciais não têm quase nada de Matemática, enquanto os direcionados para professores especializados na disciplina não conseguem atrair pessoas boas na área. "Um aluno que chega sem base no 6º ano do ensino fundamental dificilmente vai para frente. Precisamos implementar um bom currículo e, enquanto não tivermos uma melhora na formação dos professores, criarmos materiais didáticos bem estruturados. Ao mesmo tempo, é fundamental pensar desde já a longo prazo, buscando atrair gente bem formada para ensinar Matemática. Esse é o grande desafio do Brasil", analisou. Coleção orienta pais e professores para o ensino da Matemática - Entender Matemática não é fácil. Pensando nisso, Osmar Nunes criou a coleção "Matemática para pais e professores das séries iniciais". A ideia é utilizar o conhecimento que foi desenvolvido na área de Neurociência e Psicologia Cognitiva e nos conteúdos dos programas dos países que tem obtido as melhores notas nas avaliações internacionais, tudo fundamentado na realidade brasileira, para tornar a Matemática mais palatável para pais e, principalmente, professores que atuam nas séries iniciais. Ao todo, são seis livros. O primeiro é uma introdução e dá uma visão geral da coleção, explicando o motivo de as crianças terem dificuldade e não aprenderem a Matemática com facilidade. Os outros são voltados para os conteúdos do 1º ao 5º ano do ensino fundamental. Eles buscam mostrar ao professor como ele deve ensinar aquele tipo de matéria e como os pais podem ajudar seus filhos a aprenderem. "Quando a criança começa a ter dificuldades e não é estimulada a desenvolver seu conhecimento, ela vai acumulando isso a cada série. Sendo trabalhada desde a base, a tendência é que não tenhamos mais jovens que não saibam fazer contas com frações, trabalhar com Geometria Básica, noções de gráfico, de estatística, etc. Tudo isso depende da Matemática Básica, que pode não ter sido bem ensinada nos primeiros anos de estudo", comentou o autor da coleção. De acordo com Osmar, os pais têm um papel importante e não devem deixar de ajudar. No entanto, é preciso tomar cuidado para não exagerar e acabar fazendo o dever de casa no lugar da criança. Para os professores, a grande dica é focar naquilo que é essencial e não perder tempo com conteúdos rasos, que sirvam apenas para encher as aulas. "O ideal é reservar uma hora por dia para dar atenção ao seu filho, ver o que ela está fazendo, o que está estudando, como está na escola, etc. No caso dos professores, é bom fazer um planejamento de aula que seja realmente exequível e de ênfase no que importa de fato. Às vezes, damos muito assunto, mas não aprofundamos nada. Assim, o aluno aprende tudo superficialmente e fixa nada", orientou. |
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